A falta de parâmetros objetivos para definir quem faz jus aos benefícios da Justiça Gratuita (que não se confunde com assistência judiciária gratuita, a exemplo da Defensoria Pública) abre as portas para certas subjetividades que vão desde negar o benefício para um pequeno comerciante até conceder a gratuidade de Justiça para pessoas abastadas que aparentemente poderiam arcar com as custas e emolumentos do processo judicial.
Sendo certo que o Estado puxou para si a jurisdição (não confundindo com aquela dos filmes e seriados norte-americanos), uma pessoa não pode ter o o ao Poder Judiciário negado pelo fato de ser pobre e consequentemente sem condições de arcar com as despesas de uma ação.
Tal direito é assegurado pela Lei Maior:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
…
LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
Tal benefício já existia décadas antes da Carta Magna de 1988, mais precisamente pela Lei 1.060/1950, revogada parcialmente pelo Código de Processo Civil de 2015, que assim ou a regulamentar a matéria:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
(…)
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de te
(…)
- 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
- 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.
A base legal anteriormente transcrita, mais precisamente a ordem que aparecem o §2º e o §3º do Art. 99 do C parecem ser o motivo pelo qual alguns juízes invertem a ordem da presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência e quase sempre exigem que a parte junte comprovantes de sua pobreza. Em alguns casos, chega a ser um ônus cruel exigir juntar documentos de quem não declara imposto de renda (por não ter renda…) ou movimentação bancária de quem sequer tem conta-corrente…
Enfim, tal qual uma das frases que aprendi na obra “Pai Rico Pai Pobre”, livro favorito de um amigo de infância e hoje empreendedor, aqui repito uma regra financeira muito simples e ainda assim valiosa: “não importa o quanto você ganha, importa o quanto você gasta!”
Na minha humilde opinião, desde um desempregado até o MEI poderiam em regra pedir justiça gratuita sem tanta burocracia ou entrave para o deferimento desde pedido.
Convergente, até mesmo um militar de alta patente, ou um médico famoso e até mesmo um magistrado podem sim fazer jus a gratuidade de justiça, porém nestes casos, devidamente comprovado o comprometimento da renda com diversos gastos tais como financiamentos, empréstimos, escola ou faculdade dos filhos, pagamento de pensão alimentícia ou qualquer outra despesa significativa que demonstrasse que apesar de aparentemente “ganhar bem”, as despesas processuais significariam ameaça ao sustento do sujeito e/ou de sua família.
Resumindo, a regra deve ser o §3º do Art. 99 do C, ou seja, ser suficiente a declaração de pobreza para concessão do benefício da Justiça Gratuita e só de forma excepcional exigir a juntada de prova de hipossuficiência (§2º).
Nota de Redação: CÍCERO B. MOUTEIRA é advogado, professor universitário e de cursos preparatórios, Assessor Jurídico da PMMG e aproveita estas últimas linhas para destacar que o fato do cliente possuir patrono particular não impede o benefício da Justiça Gratuita (Art. 99, §4º do C).